Diante dos extremos climáticos, resiliência é a palavra de ordem para a educação
Escolas fechadas dias a fio por conta de enchentes, calor extremo que inviabiliza o aprendizado em sala de aula, comunidades com acesso interrompido por cheias de rios, insegurança alimentar provocada por secas prolongadas. Entre os diversos impactos que a intensificação dos eventos climáticos extremos tem causado no planeta, os efeitos nos sistemas educacionais ao redor do mundo parecem ser ainda pouco discutidos, embora sejam da mais alta importância – em especial, nos países de menor renda.
Um estudo recente, publicado pelo Banco Mundial1, aponta que, todos os anos, diversos países vivenciam um ou mais episódios de fechamento de escolas causados por eventos relacionados ao clima. No Brasil, a maior parte das faltas acontece durante as estações chuvosas, mesmo quando as aulas não são suspensas – afinal, em muitos casos, não há meios de chegar à escola. São de sete a 12 dias de aula perdidos, anualmente, devido a enchentes.
Apesar dos dados alarmantes, o fechamento de escolas por questões climáticas segue invisível, para usar as palavras do estudo, porque ninguém está trabalhando para mensurá-lo. A educação resiliente – entendida como a capacidade de manter o ensino, mesmo diante de crises e desastres – precisa se tornar prioridade política e social, com uma abordagem multidimensional, envolvendo ações econômicas, de informação e de reforço nos instrumentos de proteção social.
Um exemplo recente de como os eventos climáticos prejudicam a trajetória escolar pode ser visto nos números de alfabetização do Rio Grande do Sul. Como consequência direta das graves enchentes que assolaram centenas de cidades gaúchas entre abril e maio de 2024, mais de mil escolas – apenas na rede estadual – tiveram de ser fechadas. Em 2025, conseguimos mensurar mais um infeliz resultado dessa tragédia: o total de crianças alfabetizadas no estado caiu impressionantes 18,7 pontos percentuais (de 63,4% para 44,7%) em relação ao ano anterior, enquanto, no Brasil, subiu 3 pontos. É difícil não imaginar o quanto essa perda de aprendizagem impacta a trajetória escolar de cada um desses alunos.
As ondas de calor, hoje mais frequentes e espalhadas ao longo do ano, também provocam consequências graves para os estudantes. O Banco Mundial calcula que as crianças e os adolescentes dos 10% de municípios mais quentes do Brasil perdem, em média, 1% da aprendizagem, por ano, devido ao calor excessivo. Ao final do Ensino Médio, isso pode resultar em uma perda acumulada de até 1,5 ano letivo.
Esses dados tornam ainda mais grave o fato de as salas de aula brasileiras estarem muito mal equipadas para oferecer climatização. Como mostramos neste Anuário 2025, apenas 38,7% das salas da rede pública em uso contam com ar-condicionado. Na Bahia, esse percentual cai para 29%. Em Minas Gerais, o índice é de 11,7%. Prover conforto térmico para os alunos, seja por meio de ar-condicionado ou por uma arquitetura que valorize ventilação natural e áreas verdes, é algo que devemos exigir como parte da infraestrutura básica.
Diante desse cenário, é urgente que a ação climática na educação vá além da esfera governamental. A construção de redes de ensino resilientes também passa pelas escolas, seus profissionais, estudantes e toda a comunidade escolar. Infraestrutura sustentável, currículo com foco em educação climática, engajamento comunitário e articulação intersetorial são caminhos possíveis – e inadiáveis.
Mais especificamente, no contexto da COP30 (Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas), reforçamos que discutir mudanças climáticas sem abordar o acesso à educação é ignorar uma das faces mais concretas da crise. O Todos Pela Educação e a Editora Moderna reconhecem essa urgência e estão comprometidos em pautar o tema como central para o presente e o futuro da educação. Acreditamos que políticas públicas e esforços institucionais precisam refletir essa prioridade. O “novo normal” dos eventos extremos demanda estruturas e métodos capazes de resistir aos impactos que já estão em curso.
“Venegas Marin, Sergio; Schwarz, Lara; Sabarwal, Shwetlena. 2024. The Impact of Climate Change on Education and What to Do about It. Banco Mundial.